Mário Simas Filho
ISTOÉ Independente
STF confirma que PC Farias, o famoso tesoureiro de Collor, foi assassinado por seus seguranças e derruba a farsa do crime passional, denunciada por ISTOÉ há 15 anos
Com 15 anos de atraso, o Supremo
Tribunal Federal colocou um ponto final em um dos crimes mais rumorosos
do Brasil: os assassinatos de Paulo César Farias e de sua namorada,
Suzana Marcolino. PC Farias, como era conhecido o empresário alagoano,
foi o tesoureiro do ex-presidente e atual senador Fernando Collor de
Mello. Ele era considerado o maior conhecedor dos esquemas de corrupção
que levaram ao impeachment de Collor e apontado pela Polícia Federal
como o responsável pela movimentação de dezenas de contas no Exterior
abastecidas pelo propinoduto instalado no governo federal. Em 23 de
junho de 1996, dias antes de depor em uma CPI que investigava a relação
de empreiteiras com o Palácio do Planalto, PC e sua namorada foram
mortos na casa do empresário na praia de Guaxuma, litoral de Maceió.
Antes mesmo de os corpos serem removidos, os irmãos de Farias, também
envolvidos com o governo Collor, e a polícia alagoana passaram a tratar o
caso como crime passional. Suzana teria matado PC e se matado em
seguida. Uma versão endossada por delegados da Polícia Federal e pela
mídia em geral, mas que não tinha nenhuma sustentação em provas técnicas
ou testemunhais, como denunciaram diversas reportagens de ISTOÉ desde a
primeira semana de julho de 1996. Com base nos relatos de testemunhas,
muitas delas ignoradas pela polícia alagoana, e nos estudos feitos por
peritos e legistas de todo o País, as reportagens mostravam que PC e
Suzana foram vítimas de um duplo homicídio e que a cena do crime fora
alterada para dificultar as investigações.
ARMAÇÃO
A cena do crime (acima) foi alterada para atrapalhar as investigações. Em julho de 1996,
ISTOÉ denunciou a montagem para que o caso fosse arquivado como crime passional
No
início deste mês, o ministro Joaquim Barbosa, do STF, decidiu, em
última instância, que Adeildo dos Santos, Reinaldo Correia de Lima
Filho, Josemar dos Santos e José Geraldo da Silva, ex-seguranças de PC e
ainda hoje funcionários da família Farias, deverão ser levados a júri
popular acusados como coautores dos assassinatos. A decisão de Barbosa
não deixa dúvida. O que ocorreu na casa da praia de Guaxuma foi um duplo
homicídio e não um homicídio seguido de suicídio. “O jornalismo
praticado por ISTOÉ teve papel fundamental para que a farsa não
prevalecesse sobre os fatos”, diz o juiz Alberto Jorge Correia Lima, da
8ª Vara Criminal de Alagoas, responsável pelo processo que apura o
crime. Segundo ele, o julgamento dos ex-seguranças de PC deverá ocorrer
em setembro.
“Depois de tanto tempo, aumentam
as chances de os ex-seguranças serem inocentados, pois os detalhes já
não estão mais na memória das pessoas como na época do crime”, lamenta o
promotor Luiz Vasconcelos. “Mas só o fato de haver um júri popular
comprova que uma farsa estava em gestação.” Em março de 1997, o promotor
e o juiz colocaram em dúvida um laudo elaborado pelo legista Fortunato
Badan Palhares, da Unicamp, que procurava impor rigor científico à tese
do homicídio seguido de suicídio. Com base em reportagem de ISTOÉ, que,
amparada em pareceres emitidos por legistas de diversos Estados enumerou
uma série de falhas no laudo de Palhares, a Justiça alagoana convocou
três especialistas em medicina forense para mediar o impasse. A
conclusão foi a de que todos os indícios apontavam para o duplo
homicídio. “Se quatro pessoas estão em uma sala e uma delas é morta, ou o
assassino está entre os três que sobreviveram ou eles compactuaram para
encobrir uma outra pessoa”, diz o promotor, referindo-se à situação dos
acusados. O promotor lamenta que a farsa montada em torno da tese do
crime passional tenha impedido que investigações mais profundas fossem
feitas. Ele explica que a possível condenação dos ex-seguranças de PC
pode representar a punição aos autores dos homicídios, mas que o
mandante do crime ainda é um mistério. Em sua denúncia, o juiz Correia
Lima chegou a apontar o ex-deputado Augusto Farias, irmão de PC, como o
mentor intelectual do crime, mas o STF entendeu que não havia provas
suficientes contra o ex-parlamentar. Se a Justiça fosse menos morosa, é
provável que todos os mistérios em torno da morte de PC já estivessem
resolvidos.